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domingo, 8 de junho de 2025

PORQUE HOJE É DOMINGO


Viver é Perigoso

CARTA DE UM MARCIANO



Querido mundo, É o ano da Terra 2050. 

Escrevo estas palavras de Marte, para onde fugi há um quarto de século, após fracassar em salvar a humanidade, ao custo de perder meu coração. Faço isso para acertar contas com meu Deus, com meus filhos e com a espécie à qual um dia me entreguei. Mas também para explicar a mim mesmo como o grande amor da minha vida terminou tão mal.

Sim, porque finalmente entendi, no meu leito de morte, com meus tanques de oxigênio quase vazios, que a única coisa que realmente importa é o amor. Teslas? Starlink? Rockets? Twitter X, a plataforma desde que preguei meu evangelho? Bah! Eles não significam nada para mim hoje, tão perto de completar 80 anos, tão longe da multidão enlouquecida. Eu teria sacrificado tudo, tudo e mais um pouco, se em troca a paixão que experimentei com Donald tivesse durado. Sim. Pronto, pronto! Essa é a questão. Como fazer o amor durar?

Não foi amor à primeira vista. Tínhamos interesses semelhantes, no entanto. Big Macs, donuts, luta livre. 

Sou um homem da ciência. Como posso racionalizar isso? Tenho dificuldade. Talvez tenha sido escrito que o homem mais rico do mundo se apaixonaria pelo homem mais poderoso do mundo. 

Somos ambos pessoas espontâneas, sem filtros, como cavalos descontrolados. 

Eu amei sem restrições. Eu amei demais. Sacrifiquei tudo por ele: meu dinheiro e minha reputação. E não apenas pela felicidade que compartilhávamos, mas porque tínhamos um objetivo. Não. Mais. Tínhamos uma missão. Uma cruzada moral. Tornar nossa América grande novamente e criar um mundo melhor. Um mundo onde os homens fortes e as mentes talentosas da raça branca superior tomariam todas as decisões, livres da tirania da multidão.

Como disse Mussolini: "Tudo dentro do Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado". E o Estado seria Donald e eu. Só faltava vencer a eleição. Ele venceu graças a mim, aos meus milhões e às minhas cem postagens diárias no X.  E começamos a trabalhar.

Eliminei centenas de milhares de empregos públicos e acabei com a ajuda internacional. Disseram que milhões morreriam no que Donald chama de países "de merda", especialmente bebês e crianças. Eu chamo isso de limpeza. Purificação.

No fim das contas, fiz o que fiz pelo bem comum. Não entende? E Donald comemorou. Eu estava vivendo um sonho.

O que aconteceu? Por que aquele amor louco durou apenas alguns meses? Tento entender isso a partir do frio marciano (60 graus abaixo de zero em média anual) e reflito que as razões apresentadas na época foram insuficientes. A dívida pública, os subsídios para carros elétricos, os gastos públicos excessivos. Certo. Sim. Houve um pouco disso. Mas a razão subjacente era, como sempre quando se trata de amor, mais profunda, mais emocional. Ciúme. 

Começaram a conspirar contra mim. Satânicos, sussurravam-lhe mentiras dia e noite. E ele  como o covarde que é, apontou-me sem palavras que a intimidade entre nós tinha acabado. Eu, sendo muito sensível, percebi e um dia, puf, fui embora. Mas não em silêncio. Não — confesso — não mantive a minha dignidade. Alimentei ressentimento.

Eu o odiava tanto porque o amava tanto. Através de X, com o mundo inteiro como palco, libertei minha ira, lançando torrentes de insultos contra ele. 

E então — choro ao lembrar — o golpe mais doloroso. Soube que ele havia sido infiel. Que seu verdadeiro amor, o mais profundo e sincero, era o russo Putin. Mau gosto? 

Só me consolo com a certeza - e com isso, queridos amigos distantes, me despeço, de que hoje o universo inteiro pensa o mesmo que eu. 

Saudações astrais, 

Elon Musk

John Carlin - Clarin

Viver é Perigoso