Cada eleição conta sua própria história. As de 2024, como não poderia deixar de ser, também trouxeram ao cenário político diversas novidades —algumas nem tão novas assim. Destacarei quatro aspectos já visíveis do primeiro turno.
Para começar: As agremiações da direita pragmática, componentes do centrão no Congresso (partidos de adesão), mantiveram-se dominantes no conjunto das prefeituras. Nas eleições municipais desde 1982 (exceto as de 1985, realizadas só em 201 cidades), tais partidos amealharam em média 68% dos governos locais. No primeiro turno de 2024, atingiram 71%, ínfimo incremento em relação à média.
Segundo: PSDB, PFL/DEM e PPS/Cidadania eram partidos não adesistas de centro e direita, estando fora do centrão no Congresso durante os governos FHC e Lula/Dilma (apoiando o primeiro, opondo-se aos segundos). Conquistaram em média 19% das prefeituras do país, com seu melhor momento em 2000, no final da Presidência de FHC, vencendo em 39% dos municípios.
Em 2024, ficou claro seu declínio: obtiveram módicos 6%. O PSDB já decaía desde 2020; o DEM mudou de natureza e formou com o PSL o adesista União Brasil, incorporando-se ao centrão. Também o Cidadania minguou, reduzido agora a menos de um quarto do conquistado em 2020.
Terceiro: a esquerda. Ela nunca governou muitos municípios, conquistando em média 19% das prefeituras. Em 2012, seu melhor momento, amealhou 28%. Permaneceu pequena este ano, não se recuperando do baque de 2016 - no ápice da Lava Jato, do impeachment de Dilma Rousseff e da recessão econômica. Foi uma rara eleição municipal que refletiu o ambiente nacional.
Naquele ano, o PT perdeu 60% de seus prefeitos e vereadores; as prefeituras da esquerda como um todo se reduziram a 21% do total. A esquerda diminuiu em 2020, para 15%, e se manteve mal em 2024, com parcos 14% das prefeituras no primeiro turno. Embora PT e PSB tenham aumentado discretamente as conquistas agora, PDT, PCdoB e PV perderam muito.
Quarto, a novidade: emergiu uma extrema direita vitoriosa nos municípios. O PL, antes parte do centrão, tornou-se o principal partido desse campo, agremiação oficial do jairzismo, coadjuvado pelo Novo, nanico extremista de direita. Somados, ganharam 10% das prefeituras no primeiro turno.
Impulsionado pelo jairzismo, o PL cresceu de 349 para 510 prefeituras - aumento de 46% e com o segundo turno ainda por vir. O Novo saltou de uma para 18 prefeituras, ganho substancial que não deve ser mensurado percentualmente, pois a base de cálculo é ínfima.
Já existiam extremistas de direita alojados em outros partidos, mas não contavam com agremiações próprias. Isoladamente ainda são pequenos, menores mesmo do que a esquerda. Porém, são normalizados pelos partidos do centrão, que apoiam seus candidatos e buscam seu suporte em muitos lugares.
Formar um cordão sanitário em torno dos extremistas não é cogitado por nossa direita (demasiadamente) pragmática. Aliás, o próprio PL vive uma tensão interna entre os pragmáticos de Valdemar Costa Neto e os ideológicos do Jair.
Diferentemente de 2016, quando vários outsiders foram eleitos prefeitos, não se trata agora de uma onda, mas da consolidação de um segmento do espectro político-ideológico. O jairzismo abriu espaço e estabeleceu uma extrema direita estruturada partidariamente, que ganha prefeituras não como reflexo da polarização nacional, mas por sua implantação local, com uma base eleitoral própria.
Cláudio Couto
Cientista político, mestre e doutor pela USP, é professor adjunto do departamento de gestão pública da FGV EAESP e pesquisador do Cepesp. Produz o canal e podcast Fora da Política Não há Salvação.
Viver é Perigoso
Um comentário:
Interessante, estes comentaristas não analisam o ELEITOR na sua excencia...o brasileiro não é politizado...mais pra alienado e esquerdista?
Eu heim.
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